Análise de estruturas: Batman Ressurge e sua Trilogia

31/12/2012 10:01

A Comparação: O Cavaleiro das Trevas Ressurge e sua Trilogia (Por Gabriel G. Sampaio)

Nunca um filme foi tão ofuscado por seu antecessor. E é esse exatamente o problema com este filme. Este é o motivo pelo qual eu saí da sala do cinema  meio desgostoso e decepcionado.

Mas vamos com calma.  O filme não é ruim. É um filme que segue exatamente o ritmo, rumo e tom dos filmes anteriores. Mas se este filme não é tão bom quanto seu antecessor,  há um motivo…  e este motivo não é simplesmente a morte do ator Heath Ledger, nem o desaparecimento do Coringa no filme.

Os motivos para este filme ser “pior” ou não tão bom/ ousado/ divertido/ impactante quanto a continuação de Batman Beggins  são 2:

O primeiro é a concepção da trilogia por Cristopher Nolan (o diretor), e o segundo é a mensagem deste último filme.

O que eu entendo sobre a concepção que o Cristopher Nolan tem desta trilogia? Você poderia me perguntar. E a resposta seria “nada”… mas para ser honesto eu saquei o que este diretor quis fazer quando eu sai do cinema e me recordei  da  exata mesma sensação que tive quatro ou cinco anos antes,  quando sai do cinema em Batman Beggins!

Em Batman Beggins, o diretor dá uma cara mais “realista” e séria ao universo do Batman – que nós já tão bem conhecíamos. Ele constrói cada um dos personagens principais, incluindo o herói, os aliados do herói, mas principalmente o cenário vivo e plausível que é a Gothan City de Nolan.

Já na continuação, O Cavaleiro das Trevas, o diretor pega todas as expectativas que temos (Todos sabem que o Coringa é doido; que o Batman é um herói que não mata, que o duas caras é um vilão de dupla personalidade, etc) e as quebra… Como assim?  Bem, Ele quebra nossas expectativas, nos surpreendendo e levando o filme a rumos que ninguém espera… Ele também quebra os próprios paradigmas do gênero de filmes de super-heróis…  Por exemplo: em que filme de super-herói, a mocinha é morta? Em que filme de super-herói  um coadjuvante (sem qualquer poder ou arma especial) derrota o vilão (digo isso pensando na cena em que o Comissário Gordon ressurge e prende o Coringa, bem quando o Batman está caído e derrotado)??? Em que filme de super-herói, há diálogos sobre “vencer a batalha pela alma” de uma cidade???

São essas coisas que fizeram Batman – O cavaleiro das Trevas, um filme tão sensacional… A Atuação dos atores, a ação e o realismo desenfreados, junto com a narrativa maestral, foram só um bônus (e que incrível bônus!!!) para um roteiro tão bom, desafiador e profundo.

Agora, voltando ao presente, e para, por fim, entender “o que diabos” Cristopher Nolan quis fazer com sua trilogia, vamos falar de “O Cavaleiro das Trevas Ressurge”.

Neste filme, Nolan volta a construir sua visão do universo de Batman. Ele introduz novos personagens que serão estabelecidos como os velhos rostos que já conhecemos (O Robin, e a mulher Gato), ele também conta o desfecho de uma cadeia de eventos que foi iniciada em Batman Beggins (com a derrota e morte de Ras Al Gul)… Ou seja, neste 3º filme, o diretor termina de construir o Batman, depois de tê-lo desconstruído de forma tão brilhante.

É por isso que eu saí do cinema com a mesma sensação de quando vi Batman Beggins e muito menos chocado ou “moralmente questionado” do que quando lembro de “O cavaleiro das Trevas”!

Essa ´a diferença entre ENTRETENIMENTO e ARTE. A arte nos choca, nos profova, questiona, nos incomoda de propósito, o entretenimento só nos diverte. E é esse o meu problema com o último filme.

Para facilitar a compreensão:

Em Batman Beggins:

Todo o cenário começa a ser construído; Os personagens começam a ser estabelecidos; os confronto e papéis que eles terão ainda ficam um pouco soltos, mas já dá pra se ter ideia de para onde vai aquela história.

 

Em O cavaleiro das Trevas:

O cenário já está estabelecido; os confrontos vão acontecendo e ficando mais e mais profundos; com os papéis já definidos os personagens vão podendo explorar a fundo suas funções; são levantados questionamentos e sérias questões morais sobre o papel do Batman, sobre a ética das coisas que ele faz, sobre a moral da cidade e seus habitantes e até mesmo sobre o tipo de história que está sendo contada!

 

Já em O cavaleiro das Trevas Ressurge:

Os confrontos já resolvidos estabeleceram um novo cenário que precisa ser novamente caracterizado (estou falando da cidade que não precisa do Batman); o conflito estabelecido entre A liga das Sombras e o Batman é enfim resolvido (é pra isso, e só isso, que serve a presença de Bane); os papéis e funções dos personagens terminam de ser construídos e podem agora ser passados adiante para outro personagem e assim um ciclo se fecha.

 

A Mensagem

Em Batman Beggins, cá entre nós, não ficou nenhuma mensagem inovadora e profunda para falar a respeito de um mundo onde um cara precisa vestir uma roupa de morcego e criar toda uma parafernália de equipamentos e ilusões para poder fazer algo pelo lugar onde vive.

Já em O Cavaleiro das Trevas, a presença de um agente do caos (O coringa) promove uma série de discussões e reflexões dentro do filme. Essas discussões abordam desde a virtuosidade de “bater em bandidos”, até a necessidade de a sociedade escolher um protetor que pode e deve protegê-la até dela mesmo. Mas no fundo, depois de ver aquela cena em que o Coringa deixa detonadores em duas balsas e manda um grupo explodir o outro para se salvar (sendo que uma balsa está cheia de “inocentes” e a outra cheia de presidiários), eu entendi a seguinte mensagem: O povo da cidade quer, no fundo, bem fundo, fazer o bem. Mesmo quando alguém os ameaça e exige que façam o mal.

Por fim, neste último filme, quando Bane toma o controle da cidade, há toda uma meia hora de filme dedicada a mostrar o que acontece com uma cidade quando ela é colocada nas mãos de loucos e o povo é incitado a fazer justiça com as próprias mãos. Ora, você pode dizer até que eu sou ingênuo em preferir mensagens como a do filme anterior, mas de mensagens ruins sobre o caráter das pessoas enquanto parte de um povo, a mídia já está cheia!

Eu não preciso de mais um filme (ainda mais um filme de super-herói) me falando o quanto nós (o povo) somos ruins por dentro e o qual é o nível de mal que podemos fazer para garantir nossa segurança. Eu até acredito que a sociedade capitalista moderna vê esse tipo de mensagem como uma crítica de o que ela se tornou… Mas enquanto um professor e alguém que acredita na capacidade do próximo para o bem, eu prefiro o questionamento de Bruce para o Coringa: “O que você está querendo provar? Que lá no fundo todos são tão feios quanto você?”

Essa mensagem serve também para vocês que acharam o filme anterior muito difícil de entender e por isso preferem um “filme de super-heróis” mais simples e menos propenso a fazê-los pensar. Mas se você finalmente entendeu porque gostou tanto do filme anterior, meus parabéns, você está pronto para assistir filmes “de arte”!