Análise de Estruturas - A fórmula da Pixar!

28/11/2012 00:26

Análise de estruturas é um tópico que visa um estudo  nas histórias e roteiros, seja em livros, séries ou filmes. Como elaborar um bom roteiro, como construir um personagem forte, como deixar a história mais interessante, além do simples fato de conta-la. Hoje vamos nos basear nas incríveis animações da Pixar. Além da fantástica perfeição nas imagens em CGI, por detrás das animações há uma boa análise do estilo de história a ser contada, mas que também não é nenhum segredo para qualquer escritor.

Análises de Estruturas – A Fórmula da Pixar  

A Fórmula da Pixar

A arte de contar histórias é mais do que milenar, ela existe desde que a linguagem se desenvolveu em conjunto com o desenvolvimento do próprio ser humano (Alguns dizem que as línguas faladas como as conhecemos surgiram com o Homo Sapiens Sapiens há quase 100 mil anos, na África).

Poucas produtoras de cinema são tão boas em contar histórias quanto a PIXAR.

Se você não sabe o que é a pixar, basta lembrar  das animações (desenhos em 3D) mais famosos da última década: Procurando Nemo, Toy Story, Monstros S.A., Wall-E e UP – Altas Aventuras.

Esses desenhos podem a primeira vista parecer simples e não ter nada de especial, a não ser bons personagens e situações divertidas, mas acontece que há muito mais do que isso por trás da construção da história de cada um deles… Existe uma fórmula!

Na matéria  “A cartilha da era Pixar”, que saiu na revista Língua Portuguesa nº 84, fala-se um pouco sobre essa fórmula:

Emma Coats uma das escritoras da Pixar compôs uma lista de dicas sobre narrativa que são muito úteis:

- O esforço do personagem é muito mais admirável que o seu sucesso.

- Defina o final antes de imaginar a parte do meio. É sério. Todo final é complicado e você deve preparar o seu logo.

- desmonte as histórias que você gostou para ver como funcionam. O que você gostou nelas faz parte de você e é preciso identifica-lo antes de por em uso.

- O esqueleto narrativo universal é:

Uma vez havia…
Todos os dias…
Um dia…
Por causa disso…
E por causa disso…
Até que finalmente…

 

Para provar que este esqueleto funciona mesmo em todos os filmes da Pixar, vamos tentar encaixar 3 histórias absurdamente diferentes no esquema. Eu escolhi para o teste  “Procurando Nemo”; Monstros S.A e Wall-E.

Vamos começar com Procurando Nemo.

Uma vez havia… Um peixe chamado Marlin que cuidava de seu filho Nemo com muito, muito cuidado, pois ele era o único filho que restou.
Todos os dias… ele levava o filho para a escola, mas morria de medo de que algo acontecesse com o pequeno e curioso Nemo.
Um dia… Nemo, cansado de seu pai super-protetor, resolveu provocá-lo e ir até as proximidades de um barco. Acabou sendo levado por um dentista colecionador de peixes, tornando-se um peixe de aquário na Australia!
Por causa disso… seu pai teve de iniciar uma busca pelos sete mares atrás de seu filho perdido.
E por causa disso… Marlin, no meio de sua busca, conhece uma peixinha muito doida chamada Dori, que depois de muitas aventuras, começa a mudar sua forma de enxergar a vida, o mundo e sua relação com seu filho!
Até que finalmente… Marlin encontra seu filho, e agora ele não é mais um pai super-protetor, e sim um peixe confiante e que respeita a capacidade de seu filho de viver e se cuidar!

 

Feito, a história de Procurando Nemo está ai, bem contada (sem detalhes, é claro) de acordo com a estrutura básica dos filmes Pixar…

Vamos agora analisar a estrutura de Monstros S.A.

Uma vez havia… Uma equipe de Monstros que trabalhavam em uma fabrica de gritos. Uma indústria do mundo dos Monstros, que abre portas para o nosso mundo, com a intenção de assustar as crianças todas as noites e conseguir com isso armazenar “ Os gritos”, que para os monstros são a única fonte de energia de sua cidade.
Todos os dias… Mike trabalhava como ajudante e Sully como o monstro assustador que invadia os quartos para assustar. Sully, embora fosse o recordista de gritos da fabrica, não estava muito feliz em viver assustando crianças indefesas.
Um dia…  Mike percebe que uma criança atravessou o portal do armário e entrou no mundo dos monstros, o que é considerado extremamente perigoso.
Por causa disso…  Com medo de perder o emprego, os dois resolvem esconder a menina na própria casa deles, se envolvendo em muitas confusões.
E por causa disso… Tentam enviar a criança de volta para a Terra.
Até que finalmente… Eles falham e acabam inclusive gostando da carismática menina, e ao fazer isso descobrem que “o riso” das crianças gera uma energia muito maior do que “o grito”. Promovendo toda uma revolução na cidade dos monstros (que enfrentava um momento de crise energética – um tema, aliás, bem atual)!

 

Embora seja um filme com tema, cenário e ambientação completamente diferente de Procurando Nemo, Monstros S.A. também se encaixa na formula da Pixar.

Mas se você não está convencido ainda,  vamos analisar o meu favorito: Wall-E.

Uma vez havia… Um robozinho chamado Wall-E, que era o último robô “limpador” da Terra, que tinha se tornado um gigantesco depósito de lixo, sem vida (exceto pelas baratas) que a humanidade deixou para trás.
Todos os dias…  Wall-E catava o lixo, empilhando-o em enormes prédios. Enquanto ele fazia isso, ele buscava itens que o ajudavam a entender quem eram as pessoas que abandonaram a Terra. Ele fazia isso porque se sentia muito sozinho e queria ter um amigo.
Um dia… Uma sonda que veio do espaço trouxe um outro robô, uma Robo nervosinha chamada EVA. Ele finalmente começa uma amizade muito valiosa com EVA, só que a Robô encontra a amostra de planta que precisa e logo uma outra sonda vem buscá-la.
Por causa disso… Ele embarca na sonda que o leva à Nave Axion, onde está a humanidade que escapou da Terra.
E por causa disso… Descobre que a humanidade (que está bem diferente do que era) não sabe que pode voltar a Terra e há robôs que não os deixarão voltar.
Até que finalmente… Ele ajuda EVA a mostrar à Humanidade  que a terra ainda vale a pena e que eles deveriam voltar. Com o retorno dos humanos à Terra, Wall-E não se sente mais sozinho, pois agora tem os amigos que queria.

 

Bem, não sobra margem de dúvida de que a Pixar segue uma fórmula em suas animações. Elas são extremamente diferentes entre si. Tem tons e personagens que mal podemos acreditar que vem do mesmo estúdio, mas a estrutura narrativa básica delas é muito similar, quase idêntica.

Mas se você acha que isso é uma coisa única no cinema, é porque nunca ouviu falar em “A jornada do escritor”, de Christopher Vogler, um livro que recorre à estruturas míticas (antes analisadas por Joseph Campbel) para enumerar ao leitor todas as etapas de construção de personagens e situações necessários para se escrever uma boa história.

Esse, porém, é assunto para uma outra história!